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terça-feira, 28 de dezembro de 2010

A hora e a vez das indústrias criativas





As indústrias da criatividade ocupam, hoje, lugar de destaque em vários países do mundo. Fala-se, inclusive, de um ciclo “virtuoso” das cidades criativas. No Brasil, o assunto pode ganhar lugar de destaque na agenda nacional com as perspectivas abertas pela mudança de governo e, mais adiante, pela realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas.

Nos Estados Unidos de há muito percebeu-se a importância desse segmento capaz de mobilizar, direta ou indiretamente, cifras que superam resultados de tradicionais setores da economia. O mesmo ocorre na Europa, onde países como a França e a Espanha investem pesadamente em infraestrutura cultural visando, principalmente, à indústria do turismo. Dados recentes publicados pelo jornal “El País” revelam que, desde a década de 90, o governo espanhol aplica, em cultura, algo em torno de três bilhões de euros anuais. Os resultados são alentadores. Para não ir muito longe, basta lembrar que o turismo responde, hoje, pela segunda fatia do PIB espanhol. Na França, estatísticas mostram que, para cada euro aplicado na área, cinco retornam através do turismo.

Mas a grande novidade sobre o assunto veio da Inglaterra, no fim da década de 90, com a ascensão do New Labor, de Tony Blair. Reconhecendo a crescente importância das chamadas creative industries para a economia inglesa, o então primeiro-ministro instituiu um ambicioso programa de incentivos às atividades que têm origem “na criação e na habilidade individual e que geram emprego e renda através da exploração da propriedade intelectual”. Publicidade, arquitetura, mercado de artes e antiguidades, artesanato, moda, design, cinema, software em geral e lazer interativo, artes cênicas, editoração, televisão e radio constituem os setores-chave das creative industries, com as quais se relacionam, direta ou perifericamente, outras áreas como turismo, hotelaria, museus, galerias de arte e gastronomia.

O sucesso do programa inglês foi tão grande que tanto Gordon Brown como David Cameron trataram de manter as indústrias criativas no topo da agenda política de seus governos. Além de apresentarem sucessivos planos com o objetivo de transformar o Reino Unido em centro mundial dessas indústrias, os três primeiros-ministros ingleses vêm desenvolvendo esforços no sentido de ampliar esta política para várias cidades do pais.

No Brasil, diversos levantamentos revelam o imenso potencial das indústrias criativas, mesmo levando em conta que nossas pesquisas utilizam um conceito menos amplo que na Europa e nos Estados Unidos. Dados recentes mostram que o setor movimenta anualmente cerca de oito bilhões de reais, o que corresponde
aproximadamente a 1% do PIB nacional. Não é pouco, principalmente levando-se em conta que, em nossas burocracias públicas, este assunto jamais chegou a ser tratado como uma prioridade.

Tanto em plano nacional como regional, o reconhecimento da importância dessas indústrias pode introduzir, entre nós, um novo paradigma de desenvolvimento econômico. Para que isto ocorra é necessário que a sociedade seja mais bem informada e que os governos demonstrem sensibilidade e vontade política em relação ao tema.

Do ponto de vista governamental, especialistas recomendam a adoção de medidas como a criação de uma agência que regule a atividade e funcione como pólo de articulação entre agentes públicos e privados. Recomenda-se, também, a concessão de incentivos fiscais que beneficiem investimentos na área, assim como institucionalização de um fundo que alie empréstimos, capital de risco e financiamento de projetos, capaz de alavancar negócios que necessitem ganhar escala.

Mesmo sendo este um programa de caráter nacional, o Rio de Janeiro é, sem dúvida, a cidade brasileira que reúne condições estratégicas mais favoráveis para se transformar num pólo de referência destas. A presença, aqui, de importantes instituições culturais e científicas e a expectativa das Olimpíadas de 2016 reforçam a aproximação do Rio do status de cidades como Paris, Londres e Barcelona, onde a excelência em criatividade já é entendida como âncora do desenvolvimento econômico.

O Globo, Opinião, em 27/12/2010

HELENA SEVERO é cientista social.

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